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MISSA DE NATAL DO PADRE HSIA


  10 de novembro de 2015

MISSA DE NATAL DO PADRE HSIA

           Uma história real – uma lição de vida

                                                        José Carlos Buch

Assim começa o artigo de Jean Pasqualini, publicado nas pags. 1/6 da Revista Seleções do mês de dezembro de 1970.  “A missa de Natal do Padre Hsia foi realizada numa vala congelada, num campo chinês de trabalho forçado. Entretanto, nas maiores igrejas de toda a Cristandade, nesse dia não foi dita nenhuma missa que se lhe comparasse”.  O fato narrado do qual o autor do texto original é a única testemunha,  é tão  fascinante e emocionante  que permaneceu indelével na memória do colunista por todo esse tempo até que, graças à disponibilidade e ajuda do Dr. Paulo Curi,  que possui a coleção completa  da revista Seleções(850 revistas),  desde a número 1(publicada no Brasil em fevereiro de 1942), foi possível pesquisar e  localizar a edição que publicou na íntegra o artigo. O texto a seguir é uma tentativa de resumir a história sucedida na noite de Natal de 1961, num campo de concentração de prisioneiros ao sul de Pequim. Padre Hsia era um chinês frágil de rosto encarquilhado e olhos indômitos. Em 1947, na sua província natal Yangkiaping,  havia se tornado prisioneiro do regime comunista em Chinês imposto Mao Tse-tung que,  perseguia os cristãos,  por entender que eles adoravam “o Deus dos imperialistas”.  Por ser  padre,  Hsia foi condenado a 20 anos de trabalhos forçados. Durante o dia, o velho e alquebrado monge carregava 30 quilos de estrume em cestos,  sobre a terra coberta de repolho. O trabalho começava ao raiar do dia e se estendia até escurecer. A refeição diária não ia além de um substituto de pão e uma tigela de sopa. À noite era trancafiado junto com Jean(autor do artigo original) em  uma cela que era um verdadeiro antro de sujeira, infestada de mosquitos e pulgas. Proibido de rezar na sela,  o fazia escondido.  As mortes eram inevitáveis e os cadáveres eram levados pela longa ladeira até ao cemitério. Era o mês de dezembro daquele 1961,  o tempo ficara tremendamente frio e soprava do noroeste um vento cruel e ululante. Hsia aproximou-se do companheiro de sela,  à beira dos arrozais,  e perguntou – Sabe que dia é hoje?  Segunda feira, 25 de dezembro — , foi a reposta curta e cheia de irritação dada pelo amigo. Era o dia de natal, e  mesmo correndo o risco de ser apanhado pelos guardas, o padre queria rezar. – É preciso, disse ele! E, quero que reze comigo. Nós dois somos as únicas pessoas aqui para quem este dia é sagrado. – Vá para a vala de irrigação que aqui ficarei de vigia, disse-lhe o amigo Jean. A cada mudança da intensidade do vento, o grito dos guardas se ouvia. Inexplicavelmente o amigo Jean ignorou o medo de ser flagrado pelos guardas e se juntou ao padre, ao fundo daquela ravina seca,  onde Hsia celebrava a Santa Missa. Por igreja tinha aquele vasto ermo do norte da China e um monte de terra congelada como altar. Como paramento vestia o esfarrapado uniforme da prisão. Uma caneca esmaltada lascada com que se bebia água servia-lhe de cálice. De algumas uvas havia muito guardadas, conseguira extrair alguma coisa parecida com vinho, e de um punhado de trigo que podia ter roubado durante a colheita do verão tinha feito um biscoito fino para usar como hóstia. Não havia velas ladeando o altar, em lugar delas, uma pequenina chama tremia sobre alguns gravetos que levavam as preces do velho celebrante diretamente ao céu. Por coro,  tinha o vento noroeste que soprava sem parar e se transformava num hino que se espalhava pelos quatro cantos da terra. Ao final da celebração,  Hsia profetizou: — “Rogo ao Senhor que compreenda que não o quisemos ofender. – Não foi uma maneira própria…”  A sua preocupação,  longe do medo de ser flagrado rezando e possivelmente fuzilado, consistia na possibilidade de, com a sua singela celebração,  ter ofendido a Deus. Instantes depois o guarda Yang,  pedalando sua bicicleta,  em tom ameaçador,  aproximou-se da vala e indagou – Que é que estão fazendo aí? — Este velho maluco resolver fazer um fogo para aquecer-se, respondeu o amigo e único presente à missa. – Parem de trabalhar na hora de descanso e não antes, berrou o cruel e rancoroso Yang –. A grandeza do gesto do velho monge levou Jean,  companheiro de cela e de celebração e que escreveu o artigo a concluir que, — “sobreviver simplesmente, como um animal sobrevive, pela astúcia e pelo medo constantes, não basta para um homem. É preciso algo acima de si mesmo pelo qual se viva, um sonho, uma fé.” —  Hsia, não se sabe se sobreviveu ou não aos anos que lhe restavam  de condenação. Mas, ainda que os comunistas o tenham matado, destruíram apenas o corpo que abrigava aquela alma invencível, pois,  esta viverá para sempre e jamais esteve ao alcance deles. Seguramente em nenhum lugar do mundo, naquele dia de Natal, nem mesmo nas mais grandiosas igrejas Cristãs, poderia alguém estar celebrando uma missa tão cheia de significado como aquela. Feliz Natal e, lembre-se que os maiores presentes,  que se pode dar e receber,  – um abraço afetuoso, um gesto de amor, um simples cartão escrito à mão(cada dia mais raros) –,  não necessitam de embalagens bonitas e multicoloridas.  Um  venturoso ano de 2014,  com muitas realizações e igual número de sonhos.                   

(Este artigo é dedicado ao Padre Synval Januário, cuja fé, humildade e religiosidade,  o faz um homem muito próximo de Deus.)

Nota: Os interessados em obter a íntegra do artigo original,  publicado na revista Seleções,  em dezembro de 1970,  poderão solicitar pelo e.mail abaixo ou acessar o site do colunista.

                                                        advogado tributário

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