UM PAÍS SEM PRAZO E SEM HORÁRIO
Em nosso país, chegar atrasado aos eventos que, também nunca começam no horário previsto, é praxe e faz parte do execrável rol do “jeitinho brasileiro”. Pode se dizer que no Brasil somente as missas e o jornal nacional obedecem religiosamente horário. Quem de nós nunca se viu atropelado pelo relógio para chegar a tempo do início de audiências, consultas médicas, reunião com autoridades e tantos outros compromissos, cujo horário nunca foi respeitado? Certamente em algum dia em alguma repartição ou consultório o pobre brasileiro e principalmente o brasileiro pobre esteve sujeito ao incansável chá de cadeira que, não bastasse o flagrante desrespeito ao princípio básico de cidadania, resulta sempre em abominável perda de tempo e dinheiro. No projeto utópico de uma nova constituição escrito por Capistrano de Abreu constava apenas um artigo e um parágrafo: “Art. 1º – Todo brasileiro deve ter vergonha na cara. Parágrafo único – revogam-se as disposições em contrário.” Nossos órgãos públicos, não bastasse a manifesta, desmedida e flagrante burocracia, funcionam “a meia boca”, como se diz na gíria. Confira-se o horário de expediente de alguns: Receita Federal das 8:00 às 12:00 hs.; INSS das 8:00 às 16:30 hs.; Posto Fiscal das 9:00 às 16:00 hs.; Cartórios 10:00 às 17:00 hs.; Prefeitura das 9:00 às 17:00 hs.; Judiciário p/público das 13:00 às 19:00 hs.. É de se perguntar – Porque as empresas, escritórios de serviços ou estabelecimentos privados, funcionam no horário comercial e os órgãos públicos não? Um amigo relatou que num domingo de manhã, na divisa entre a França e a Suíça, foi possível fazer câmbio num pequeno estabelecimento bancário. É assim em toda a Europa. No Brasil, só nos principais aeroportos e olhe lá! Como afirmou certa feita, o renomado jurisconsulto Dr. Plínio Gustavo Prado Garcia, “O Estado brasileiro é aético. Nesse Estado aético, as autoridades do momento se esquecem de sua condição de cidadãos. Incorporam o poder que lhes foi conferido pelo povo, e tudo fazem pelo poder e para o poder.” No nosso paquidérmico judiciário, prazos só existem para advogados. Juízes, promotores não têm prazo e procuradores, não bastasse o privilégio de só serem intimados pessoalmente, contam com prazo em dobro e até quádruplo, conforme o caso. Por conta disso, centenas de milhares de processos dormem nas prateleiras dos cartórios ou nos gabinetes dos julgadores a espera de decisões que, em muitos casos, só saem quando o autor já faleceu, lembrando que mais 70% das ações que atravancam o judiciário são movidas contra o INSS que, apesar de não lograr êxito em 99% dos casos, insiste em procrastinar o processo e não reconhecer o direito daqueles que construíram o nosso país. Mas, o exemplo vem do próprio Supremo Tribunal Federal. Veja o caso da ADI-Ação Direta de Inconstitucionalidade de nº 2390 movida em 15 de janeiro de 2001 pelo PSL-Partido Social Liberal, apensada às ADIs de nºs 2386 e 2397, respectivamente, movidas pela CNI-Confederação Nacional da Indústria e PTB-Partido Trabalhista do Brasil também em 2001 e, ainda, ADI nº 4006, promovida em 17/01/2008, pela Confederação Nacional dos Profissionais Liberais (CNPL), onde se discute a inconstitucionalidade da quebra do sigilo bancário instituída pela LC nº 105/2001. O caso já foi pautado para julgamento em duas oportunidades e suspenso em face sucessivos pedidos de vista . Desde então, prestes a completar dez anos do ajuizamento da primeira ADI, não se tem noticia de quando a matéria vai ser julgada. Enquanto isso, pessoas e empresas, sem que haja autorização judicial, têm suas contas bancárias expostas ao fisco numa verdadeira devassa fiscal. Essa matéria promete superar o tempo de julgamento do fatídico empréstimo compulsório sobre veículo e sobre combustível instituído em 1986 e somente julgado inconstitucional pela Suprema Corte em 10/10/1995, quando a prescrição(perda do direito) alcançava a grande maioria dos brasileiros lesados. Como já antecipava Rui Barbosa no começo do século passado, “justiça tardia não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”. Algumas iniciativas estão sendo tomadas para agilizar o judiciário mas, tímidas, são pouco significativas diante da complexidade do sistema que permite um número absurdo de recursos e toda a sorte de procrastinações. O Brasil também é um dos únicos países e ter uma justiça especifica para as questões do trabalho. Em média são mais de 2 milhões de novas ações a cada ano, enquanto nos EUA não passa de 75 mil, na França 70 mil, no Japão 2.500, números que não são muitos diferentes na Argentina e Chile. Certamente o dia em que forem fixados prazos para os julgadores e promotores, tal como o são para os advogados; o dia em que os procuradores públicos perderem o privilégio de serem intimados pessoalmente e passarem a ser pelo Diário Oficial, tal como são os advogados e, finalmente, o dia em que se fixarem prazo e limitação aos pedidos de vista para apenas um, podendo ser compartilhado por mais de um julgador, certamente o país será outro. Conquanto, é quase certo que esse outro país não será vivido pela atual geração. Quem viver verá!
P.S. O colunista também é vitima do INSS e da lentidão do judiciário. Processo de revisão de valores ajuizado em 1997, foi julgado procedente em Catanduva e, apesar dos insistentes e reiterados pedidos pessoais, encontra-se no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, desde 24/05/99. Com isso, já se passaram 13 anos.
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