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COMO SE TORNAR VÍTIMA DA RECEITA FEDERAL


  31 de dezembro de 1969

Era o mês de dezembro de 2003. Nas ruas os preparativos para festas de final de ano já davam sinais de vida. A televisão esboçava exibir os comerciais natalinos com músicas envolventes, família feliz e o caminhão todo iluminado da coca-cola percorrendo cidades e colinas em meio à neve. O mesmo serviço do correio que começava a entregar mensagens de boas festas, foi portador de uma notificação expedida pela Receita Federal que provocaria desdobramentos inusitados na vida de um cidadão brasileiro. Vamos identificá-lo, para preservar a sua identidade e, em respeito ao princípio constitucional do sigilo fiscal, de  simplesmente FR lembrando que o R é um patronímico de origem italiana incomum e de difícil homonímia. A notificação pedia explicações para a origem da remessa no mês de fevereiro de 1998, de aproximadamente seiscentos mil dólares para uma determinada conta num determinado banco de Nova York. Claro que prontamente foi dado conhecer à Receita Federal que o notificado nunca tinha estado em NY, nunca teve conta no exterior e, em toda a sua vida profissional, jamais amealhara importância tão expressiva visto que era um simples gerente de loja, casado com uma professora, cujo patrimônio não ia além da casa, bem de família, e dois veículos de pequeno porte. E mais,  esclareceu que há mais de dez anos era correntista de um único banco, aliás, oficial. Procurou o Delegado da Polícia Federal de sua jurisdição expondo os fatos e solicitando a abertura de inquérito.  Debalde os seus argumentos. O Delegado da Receita Federal, julgando-se autoridade acima do bem e do mal, alegou que não poderia instaurar inquérito e só o faria mediante pedido expresso do Ministério Público Federal, não sem antes objurgar –  Se requer,  o pedido será indeferido, acrescentando que na sua experiência tinha certeza que FR havia assinado os documentos para movimentar conta no exterior.  Transcorrido um ano, na mesma época natalina agora de 2004, perplexo recebe um presente da Receita Federal que o fez aumentar ainda mais a  posologia do calmante lexotan que passara a fazer uso para poder dormir. Ignorando seus argumentos, a Receita imputou-lhe uma auto de infração de quase quinhentos mil reais alertando-o que o não pagamento ensejaria sanções de toda ordem, inclusive, representação ao Ministério Público por crime contra a ordem tributária e evasão de divisas. A partir de então, o simples cidadão  FR passou a ser acusado de crimes que, de longe,  jamais imaginou poderia um dia ter capacidade, ousadia e tirocínio para tê-los cometido. Lembrou-se então que vivia num país onde a voracidade fiscal era capaz até mesmo de atropelar direitos elementares do cidadão. Na peça de defesa usou-se de todos os argumentos para provar a absurda acusação demonstrando que nunca estivera em NY, nunca havia assinado qualquer documento para abertura de conta fora do país  e, a única viagem feita ao exterior, presente da empresa onde trabalhava,  teve como destino Miami de onde seguiu para outra cidade do centro oeste americano para participar de uma feira. Abriu mão do seu sigilo bancário, requisitou perícia e sindicância(mesmo sabendo que dificilmente será atendido) e procurou demonstrar que tudo não ia além de um grande e abominável equívoco. Ao mesmo tempo, usando de suas parcas economias,  contratou uma  advogada em Nova York cuja nomeação teve que ser por instrumento de procuração celebrado no Consulado em São Paulo, para o fim de se  obter documentos que pudessem subsidiar ainda mais a  defesa. Depois de longo périplo a diligente  advogada americana conseguiu obter documento firmado pelo banco americano sediado em Nova York  que o seu cliente, também FR, não era o mesmo que residia em Catanduva e protagonista dessa história. Esse documento e outros tiveram que passar pelas mãos de um tradutor juramentado para servir de prova no processo.  Mas, lembrando a máxima de que nada acontece por acaso, nesse interregno o nosso protagonista  FR é contatado por um escritório imobiliário dos jardins em São Paulo interessado e locar um flat que supostamente lhe pertencia naquela região. A sócia desse escritório argüiu que inúmeras vezes intermediou a locação do dito flat mas que havia perdido o telefone de contato de uma tal Rita de Cássia  que administrava o imóvel que pertencia ao senhor FR., cujo novo telefone havia sido obtido na internet. Diligenciou-se até São Paulo e se deu busca em todos os registros do tal flat no cartório de registro de imóveis para identificar o impostor FR, infelizmente sem êxito. Dias depois outro escritório imobiliário o procurou também interessado na locação do mesmo flat. A história era a mesma, levando a concluir que o impostor FR chegou a ser titular de imóveis em São Paulo.  O processo na fase administrativa que teve início no mês de dezembro de 2004, se arrasta desde então e, por  certo está longe de chegar ao seu final. Preocupa o fato de ser eventualmente julgado desfavorável  ao FR, em primeira instância, e aí a coisa se complica, pois para recorrer à segunda instância –  Conselho de Contribuintes em Brasília, FR, a vítima,  terá que depositar 30% do valor do auto de infração, qualquer coisa da ordem de R$180.000,00, tendo em vista que o valor do auto de infração atualizado ultrapassa a R$600.000,00, ou caucionar bens no valor total dessa exigência, impossível para uma simples cidadão de classe média que não dispõe desse patrimônio. Por outro lado, espera-se que a coisa se resolva em primeira instância sanando o equívoco e  devolvendo a paz e a tranqüilidade ao verdadeiro FR. Fica a pergunta –  Como o impostor FR conseguiu transferir recursos de monta para o exterior e ser titular de imóveis em São Paulo sem até agora ser identificado, lembrando que no cadastro da Receita Federal só figura um FR, o protagonista dessa história. Prometo que volto um dia pra contar o desfecho desse episódio.            

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