O IMPOSTO QUE NOS FOI IMPOSTO
“Disse alguém que o imposto era a maneira mais justa e mais eficaz que o contribuinte tinha de colocar a sua fazenda. Decerto. Decerto. Decerto, se as despesas públicas fossem nascidas da utilidade e do bem do povo; se os recursos que o imposto dá fossem administrados com economia, vigilância, probidade e inteligência; decerto, se as despesas servissem para acrescentar o poder, a riqueza, a moralidade, a nobreza da nação; decerto, se essas despesas fossem com um sistema de instrução pública bem aplicado, se fossem para cumprir os terríveis compromissos do Estado para com os seus credores, se fossem para grandes obras públicas sabiamente reguladas. (…)”.
Eça de Queiróz
Nessa semana, após o périplo judicial de mais de quatorze anos, consegui resgatar pouco mais de oito mil reais que compulsoriamente me foi expropriado no ano de 1.986, pelo governo do, ainda, político José Sarney. Na época imperava no Brasil o “Plano Cruzado” e, por conta da aquisição de um automóvel Monza Ok, tive que recolher aos cofres da União o correspondente a 30% do valor do veículo, por força de determinação expressa no Decreto-lei nº 2.288/86. É preciso lembrar que a absurda exigência incidia também sobre o combustível no percentual de 28%, mas essa é outra história. Irresignado com absurdo confisco, a exemplo de milhares de outros brasileiros, ingressei com ação em 22 de julho de 1.991, visando a restituição do valor que entendia indevidamente pago de Cr$30.066,89(dinheiro da época) até que, finalmente, nessa semana a novela chegou ao fim. Dirá o leitor – enfim se fez justiça! Será? Pra começar o governo da época criou a figura do empréstimo compulsório para assacar o dinheiro do contribuinte. Esse empréstimo tem previsão constitucional(art. 148, da C.F), porém, a Carta Magna é muito clara ao dispor que a sua instituição só pode ocorrer mediante lei complementar para atender despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência e, ainda, no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional. Como é sabido, nenhuma das situações previstas constitucionalmente se faziam presentes à época do fatídico programa de estabilização econômica que ficou conhecido como “Plano Cruzado”, daí porque não havia como não ser reconhecido o direito do contribuinte. Mas, a questão tem que ser analisada por outro prisma. A tal expropriação foi criada como empréstimo compulsório. Pois bem, emprestar na definição do “Dicionário Aurélio” significa “1. Confiar a alguém (certa soma de dinheiro, ou certa coisa), gratuitamente ou não, para que faça uso delas durante certo tempo, restituindo-as depois ao dono; ceder.” Assim, se sério fosse o governo, todos que contribuíram deveriam, após decorrido certo tempo previsto na lei que instituiu o tal empréstimo, receber de volta aquilo que compulsoriamente pagaram. Não foi isso o que ocorreu, apesar da Suprema Corte, anos depois ter reconhecido a inconstitucionalidade do indigitado decreto-lei. Assim, me considero um privilegiado, pois apesar da notória defasagem da correção monetária que fez com que o valor restituído se revelasse aviltado, consegui reaver aquilo que irresponsavelmente me foi usurpado. Quantos assim não o fizeram e não mais poderão fazê-lo, pois o tempo conspirou contra eles em face a prescrição? Por outro lado, melhor seria nada receber de volta se outro o país fosse, com menos injustiça social, menos corrupção, menos desemprego e, sobretudo, mais sério.