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A MALA É UM SACO, O CADEADO É UM NÓ


  9 de dezembro de 2010

A MALA É UM SACO, O CADEADO É UM NÓ   

                                                                 José Carlos Buch

Esta frase, como tantas outras, criativas, originais  e engraçadas só poderiam  ser de autoria de alguém que estivesse de bem com a vida e com o mundo. Era a expressão usada para dizer que estava sempre pronto pra viajar.  Os amigos, que eram muitos, ao ler o título deste artigo, certamente identificarão de pronto de quem se trata. Não lhe faltavam outras “tiradas” como: — “que horas  que o senhor quer que seja, patrão” ao ser indagado sobre o horário. “Manicaca” para identificar piloto de aeronave indeciso, medroso e inexperiente ou mesmo motorista “barbeiro”. “Drenar o inferior”, outro termo aproveitado da aviação  para identificar o ato de fazer xixi. “Estolado de dorso” também termo aeronáutico ao se referir a uma queda ou alguém cansado, na pior. De baixa estatura, cabelos começando a se tornar grisalhos,  intrépido, ligeiro, porém sempre alegre, logo cedo aprendeu com o seu pai o oficio de consertar geladeiras,  atividade que abraçou até a adolescência, quando então começou a desenhar e perseguir o sonho que o faria relativamente rico, voando entre mares, montanhas e nuvens, mas também o levaria para outro horizonte,  prematuramente.  Certamente o único aluno do curso de brevê da cidade que foi, ao mesmo tempo brevetado e punido. Tendo concluído o curso e imaginando que os instrutores o enrolavam para autorizar o vôo solo, o fez sem autorização, retirando o avião do hangar e realizando  o vôo  sem a companhia  do instrutor que deveria avaliá-lo e  aprová-lo. Embora houvesse transgredido a norma, os instrutores não podiam deixar de conceder o brevê, pois a prova final havia sido realizada com sucesso. A partir do banho de óleo queimado, que tradicionalmente se constitui no batismo dos pilotos estreantes, sua trajetória foi direcionada para a aviação, a grande paixão da sua vida. Na aviação colecionou inúmeros amigos que não prescindiam da sua companhia, sempre alegre e agradável e, seria impossível nominá-los sem correr o risco de imperdoáveis omissões. Na aviação, fez carreira, inicialmente na empresa J.Marino, provavelmente a única que consta do registro da sua carteira de trabalho, onde permaneceu por alguns anos. Em 1979,  foi se aventurar no garimpo na região de Itaituba, na margem do rio Tapajós, no Pará,   voando em condições precárias, sobre  florestas e rios, com excesso de peso e correndo sérios riscos que, certamente, o incomodavam muito, porquanto era um piloto ousado, mas excessivamente preocupado com a segurança. De piloto contratado, passou a ser titular de uma aeronave, passando a voar por conta própria. Depois adquiriu outras unidades e criou uma oficina de manutenção de aeronaves. Esse crescimento profissional rápido, conquistado com as oportunidades que só o ouro proporciona,  incomodou um ou outro concorrente levando-o a sofrer um covarde atentado, correndo sérios riscos de perder a vida, felizmente superado graças ao  providencial apoio logístico oferecido  por alguns amigos de Catanduva e, principalmente pelo suporte dado pelo seu amigo  Dr. Luis Carlos Marino que o acolheu em São Paulo, num dos melhores hospitais da capital,  permitindo a sua recuperação, longe dos seus algozes.  Os recursos que obtinha em Itaituba, à custa de muito trabalho e tirocínio, investia em imóveis em Catanduva tendo adquirido também uma área de terra em Cáceres, no Mato Grosso onde criava gado. Amigo de muitos amigos, nunca esqueceu sua terra natal e, a certa altura, entendeu que deveria retornar às suas origens para cá transferindo sua oficina de manutenção de aeronaves e desfazendo-se das aeronaves que voavam no garimpo. Longe dos riscos do trabalho no garimpo,  após algum tempo já reintegrado na sociedade catanduvense, da qual nunca se distanciou, contrariando conselhos dos amigos,  retornou a Itaituba para receber a parcela final da última aeronave que havia vendido. Foi induzido a viajar até Manaus, onde o suposto pagamento seria feito. No horário marcado, no fatídico  dia 16 de fevereiro de 1993,  nas proximidades do Banco do Brasil da capital amazonense, foi covardemente assinado, quando contava com apenas 40 anos de idade,  interrompendo uma vida que se descortinava esplendorosa,  num verdadeiro céu de brigadeiro.  Com ele foi sepultado, também,  o sonho de fazer do Aeroclube de Catanduva, uma referência na manutenção de aeronaves de pequeno porte, tal como o é na formação de pilotos. Reinaldo Joaquim Pagiossi, considerado piloto completo, “rei do pé e mão” como era conhecido no meio,   morreu às  vésperas do carnaval, festa que ele mais amava, deixando dois filhos, a Patrícia, hoje com 25 anos  e o Fábio,  com 28 anos que, em vida o reconheceu de fato como filho e não teve tempo de reconhecê-lo de direito.  O seu velório, no hangar do Aeroclube, atraiu centenas de pessoas, não faltando o sobrevôo de inúmeras aeronaves e uma chuva de pétalas de rosas no seu enterro.  A sua viagem final, sem volta, sem manche, sem manete, sem flap,  sem pedal, sem transponder, sem  ADF e VOR,   sem leme, sem bússola,  sem altímetro, sem mapa,  sem carta de navegação  e, principalmente, sem um plano de vôo, seguramente  por que este  só estava escrito nos planos de Deus. Com certeza, estava faltando um comandante eclético e perspicaz para pilotar com segurança e rara habilidade as aeronaves do Senhor.             

                                                       advogado tributário

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