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CAFÉ DA ESQUINA


  1 de dezembro de 2012

CAFÉ DA ESQUINA  

                                                                 José Carlos Buch

São menos das seis horas da manhã.  Valdir Baldo, o amigo de longa data e de todas as manhãs,  Urbano Sales e  dois funcionários,  descerram  as duas portas do mais famoso café da cidade. Menos de seis horas atrás, por volta de meia noite e meia, a mesmas portas haviam sido fechadas pelo irmão e sócio, João Baldo, também conhecido como “João Cabeça Branca”,  que se revezava na tarefa diária de abrir e fechar o estabelecimento. Na periferia o galo, acordando o galinheiro,  acabara de anunciar o alvorecer daquela manhã fria, de pastagens e baixadas dos rios orvalhadas e ainda adornada com um véu de  névoa que escondia os andares dos poucos edifícios que existiam na cidade. Um grupo de madrugadeiros e notívagos já se encontrava sentado na larga soleira de mármore do prédio do Banco do Brasil, que ficava no sentido diagonal ao Café. Alguns carros desciam a Rua Brasil e outro grupo menor,  na calçada em frente o Banco Moreira Sales,  apostava pequenos valores nas placas, escolhendo par ou ímpar ou mesmo a dezena. Para eles,  o dia começava como um jogo.  O grupo maior, contudo,  estava postado na calçada bem em frente ao estabelecimento na Rua Alagoas,  que abrigava na calçada oposta recuada, um ponto de táxi. Apenas dois Chevrolets 49 pretos de pneus faixas brancas impecáveis estavam no ponto e seus respectivos choferes de praça, como eram conhecidos,  aguardavam soar a campainha estridente do telefone preto que ficava na pequena cabine bem na esquina,  para a primeira corrida.  Em menos de dez minutos o aroma inconfundível do café de coador de pano passado na hora,  direto no bule de alumínio, atrairia a atenção de todos, principalmente dos fumantes que aguardavam esse momento para fazer a tradicional boca de pito do primeiro e nefasto cigarro da manhã. No grupo da soleira de mármore do Banco do Brasil, as conversas giravam em torno das dificuldades da cafeicultura e críticas, pra variar, ao governo que não dava apoio à agricultura. No grupo em frente ao Banco Moreira Sales rolavam acaloradas discussões sobre futebol e problemas da cidade. Finalmente, as pessoas postadas na calçada em frente ao café discutiam temas variados, desde a intensidade do frio e da seca até mesmo críticas ao governo do estado que só prestigiava São José do Rio Preto, então governada por prefeito do mesmo partido. Não demoraria muito e o prefeito que morava nas imediações e  que era do partido contrário ao governo estadual,  se não estivesse viajando para São Paulo,  deveria aparecer para o tempo necessário de tomar um café, sempre um pouco antes das oito horas, acompanhado de alguns poucos asseclas. Assim, as pessoas eram facilmente identificadas pelos grupos que escolhiam ficar.  À medida que o sol começava a aquecer a cidade, as pessoas deixavam suas casas rumo ao trabalho e,  a Rua Brasil ganhava o movimento de pedestres e veículos. A Praça da República, de jardins muito bem cuidados e fonte luminosa funcionando nos finais de semana, aos poucos via seus bancos serem ocupados por aposentados, desocupados e,  um ou outro mendigo. Já se aproxima das oito horas e muitos comerciantes das imediações, tal como um ritual com dia e hora determinados, marcariam presença no café para sorver a bebida forte, quente e reconfortante que, nessa altura do campeonato,  já estava na quarta ou quinta rodada, quer dizer,  coada. Não demoraria muito e o barulho orquestrado do ranger das portas onduladas de enrolar das lojas,  sinalizaria o início de mais um novo dia. Em instantes as bandeiras do Brasil e do Estado estariam afixadas nos suportes existentes nas paredes e tremulando, adornando as frentes de muitos estabelecimentos que fizeram a cidade ser conhecida também como “cidade da bandeiras”, slogan esse imortalizado na música do trio Luizinho, Limeira e Zezinha. Nessa altura, muitos daqueles que primeiro chegaram já se teriam ido  – fazendeiros para suas lavouras; médicos e dentistas, para seus consultórios; advogados, contadores, corretores de seguros, profissionais liberais,  para os seus escritórios e comerciantes para os seus estabelecimentos. Os menos ocupados, principalmente aposentados, corretores de imóveis, políticos e vendedores de bilhetes e rifas, agora formando um novo grupo,  permaneceriam no local. As coadas de café continuariam por todo o dia, fazendo daquele local, por muitos chamado de “esquina maldita”, como o ponto mais conhecido e tradicional da cidade. Por lá passaram políticos de destaque no cenário nacional, dentre deputados, secretários de estado, senadores, ministros de estado, governadores e até presidentes da república.  Décadas se passaram — a Rua Alagoas passou a ser  calçadão perdendo o seu encanto e o nostálgico brilho; a soleira do Banco do Brasil cedeu lugar para o moderno prédio onde hoje funciona a agência da Caixa Econômica Federal; o prédio do Banco Moreira Sales, hoje Banco Itaú,  externamente continua igual com os seus três andares e,   as pessoas que atualmente lá se reúnem, não são as mesmas, com algumas poucas exceções, como lembra o Dr. Paulo Cury que,  por longos anos,  manteve o seu escritório de advocacia na sala 31 no 3º andar do Edifício do Café e,  há três décadas ocupa a sala 111, do 11º andar,  do mesmo prédio. Contudo, o café da esquina,  sucedido há anos por novos donos,  continua praticamente igual:  pequeno e espremido, mas  ponto de referência e servindo o melhor café da cidade que continua sendo feito, a todo instante,  em coador de pano e diretamente no bule de alumínio, para deleite daqueles que apreciam a bebida mais consumida no mundo.               

                                                                 advogado tributário

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